É comum as crianças mentirem e, em geral, as que mentem mais o fazem porque observam essa atitude nos pais. Como em tudo, os filhos refletem os atos dos pais. "Eles são o primeiro referencial das crianças. Se os pais mentem, os filhos irão mentir. Se os pais acham engraçado que os filhos mintam, eles irão continuar a mentir", esclarece Betina Serson, psicopedagoga formada em Pedagogia, com pós--graduação em Psicopedagogia pela PUC-SP, e mestre em Early Childhood Education pela Florida Atlantic University.
Mentira ou fantasia?
Quando se fala em mentira dentro do universo infantil, é preciso deixar claro que, muitas vezes, a criança não está mentindo, mas fantasiando e criando personagens imaginários - isso faz parte do seu desenvolvimento. As crianças menores não sabem distinguir fantasia da realidade, por isso, não podemos dizer se elas estão mentindo. "O que acontece é que, até os 3 ou 4 anos, a criança acredita muito em fantasia. Por esse motivo, ela se envolve muito com histórias de bruxas e super-heróis. Para elas, tudo o que os pais fazem está sempre certo ou errado. Com o tempo, ela vai adquirindo maturidade suficiente para distinguir entre o certo e o errado", explica Serson.
Mentira é contar alguma coisa de maneira não-correta para escapar de uma punição ou porque aprendeu-se que lidamos com os problemas escondendo fatos ou informações. Em muitos momentos, o ato de mentir pode prejudicar outras pessoas. Uma criança que mente que a professora ou babá a trata mal pode fazer com que essas pessoas percam seus empregos.
"Quase todas as crianças mentem alguma vez na vida. Alguns acreditam que é natural quando se confunde comportamentos mentirosos com os que misturam a fantasia com a realidade. Somente analisando melhor cada situação, poderemos classificar o que é. Teoricamente, a mentira é sempre negativa, pois, a longo prazo, a pessoa que sempre mente corre o risco de ficar desacreditada perante às pessoas. Mas não podemos negar que existem as mentirinhas socialmente aceitas. O correto é sempre ensinar a criança a não mentir, mostrando a ela que a declaração falsa será descoberta e que as consequências poderão ser muito piores. Abordar o tema através de historinhas e situações lúdicas ajuda bastante para as crianças pequenas entenderem", indica Alexandre Rivero, psicólogo especialista em Psicologia Clínica, supervisor clínico, mestre em Psicologia da Educação pela USP e professor universitário.
É mentira mesmo!
Se a criança realmente está mentindo, é preciso mostrar que o pai ou a mãe percebeu o ato e conversar com ela. "Precisa-se perguntar por que mentiu, mas não fazer isso de uma forma ameaçadora. É importante também os pais não acharem engraçado mentir."
Trate o tema conforme ele for aparecendo. O que não pode acontecer é deixar de lado e achar que tudo vai passar. "Se a mentira prejudicou alguém, a criança precisa sentir as consequências de seus atos. Mas não se deve acusar uma criança injustamente, como também não se deve rir quando uma criança faz alguma coisa errada, como mentir e prejudicar alguém. Às vezes, a criança mente para chamar a atenção, o que chamamos de atenção negativa", finaliza Betina.
A definição de mentira por Piaget
Para Piaget, a mentira assume diversas formas no decorrer do desenvolvimento da criança e faz parte das etapas dele. "No início da vida, a criança de até um ano e meio vive a anomia, ou seja, ela não tem consciência das regras e segue certas rotinas por habituação. Mais adiante, num período entre 2 e 7 anos, a criança desenvolverá uma moral baseada na vontade do adulto, uma moral de obediência em que não há norma internalizada. Ela depende do outro para seguir a regra, inclusive a mentira, que não o é se não for descoberta e não é grave se não for punida. A punição é o critério da gravidade. A partir de 7 a 11 anos, a criança começa a compreender que mentir é trair intencionalmente a verdade. A mentira passa a ser entendida como uma falta moral que cometemos por meio da linguagem. Dos 11 anos em diante, a criança cresce com autonomia, utilizando o discernimento na formação de uma escala autônoma de valores compartilhada com o grupo", ensina Cláudia Razuk, pedagoga e coordenadora do Colégio Itatiaia (SP).
Contudo, é fundamental que os pais compreendam essas etapas, mas transmitam valores e facilitem uma reflexão sobre questões morais. "Os pais precisam estabelecer limites aos filhos e valorizar a aprendizagem da verdade. O exemplo deles é fundamental para a construção de uma pessoa verdadeira. A palavra esclarece, contudo, o exemplo convence. A correção é necessária tanto quanto o exemplo dos pais. A não-correção da mentira por parte dos educadores pode levar a comprometer a conduta da criança, atingindo a formação do seu caráter. É importante que eles percebam o interesse da criança na medida em que ela o manifesta ou quando o tema for vinculado na família por algum acontecimento", finaliza Razuk.
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