Outro dia uma moça me perguntou, no meio de uma festa, por que os homens “mentem tanto”. Achei a pergunta agressiva, mas resolvi discutir com ela da forma mais objetiva possível, para entender.
Pedi que ela me contasse sobre a mentira que a incomodava, e a resposta veio na forma de uma história bastante comum: no começo, o sujeito fala e se comporta como um homem totalmente apaixonado. Uma semana depois, ele nem atende mais o telefone. “É isso que eu chamo de mentira”, ela resumiu.
A moça estava obviamente ferida, e tinha suas razões. Na história dela, do ponto de vista dela, houve uma mentira. Ela acreditou em sentimentos que não existiam ou que deixaram de existir em tempo recorde. Tinha o direito de estar indignada.
Admitido esse fato, a situação que ela conta tem nuances – e essas merecem ser discutidas tanto quando a suposta vocação masculina para a mentira, que eu acho um tema pertinente na relação entre homens e mulheres.
A primeira nuance no caso da moça é a distorção amorosa.
Esse é o nome que eu dou ao estado de confusão mental em que a gente
se encontra quando está muito interessado por alguém. Basta a pessoa nos
olhar, basta falar conosco para que a gente acredite – com todas as
forças, e nenhuma justificativa – que nossos sentimentos são
correspondidos. É patético, mas é humano. A gente deseja tanto que
enxerga apenas aquilo que quer ver.
Quando se considera a distorção amorosa, é possível que a moça não
tenha sido assim tão enganada. Ela pode ter levado uma cantada banal e
recebido um grau de atenção protocolar, mas, movida pelos seus próprios
sentimentos, acreditou estar sendo intensamente cortejada. É muito comum
que, nessas situações, a pessoa que se sente enganada apresente como
“evidências” frases e atitudes do outro que, vistas por alguém de fora,
não pareçam evidência de coisa alguma além de um triste auto-engano.
Essas coisas acontecem.
Outra nuance importante na história da moça diz respeito ao papel de homens e mulheres no jogo de sedução.
Outra nuance importante na história da moça diz respeito ao papel de homens e mulheres no jogo de sedução.
As mulheres ainda não são responsáveis por tomar a iniciativa. Muitas
fazem isso, mas, normalmente, ainda cabe aos homens o ônus de vencer a
própria timidez e avançar com elegância os vários sinais colocados entre
ele e o seu desejo. As meninas ficam lá, lindas e passivas, enquanto os
caras se empenham em parecer engraçados, inteligentes, sensuais... Não
pensem que é fácil.
É natural que quem está nessa posição de vendedor de si mesmo fale
demais. E nem sempre diga a verdade. Cada sujeito que está por aí já
descobriu, em algum momento da vida, qual é o papo dele que cola com as
mulheres. Para alguns, será aquela conversa agressiva de macho
questionador e indiferente, que deixa as garotas inseguras. Para outros,
funciona uma postura mais contida, quase tímida, que demonstra os
sentimentos menos pelas palavras e mais pelos olhares.
Há tipos diferentes de atitudes masculinas de sedução, mas a mais comum
costuma ser o ataque direto e sem tréguas ao ego da moça. O cara diz
que ela é a mais linda do mundo. Jura que quando olhou para ela percebeu
que o tempo tinha parado. Sugere, de todas as formas possíveis, que se
ficar com ela será o homem mais feliz do planeta. Às vezes o sujeito
garante, meia hora depois de conhecer a moça, que ela é a mulher da vida
dele. Oferece, nas palavras imortais de um amigo meu, “casa, comida
& roupa lavada”.
Que mulher resiste a esse tipo de avalanche? Mas, ao mesmo tempo, que mulher com mais de 20 anos não sabe que esses exageros não passam de fogos de artifício?
Esse é o contexto, eu acho, para localizar a queixa da moça no mundo real.
No dia em que as mulheres tiverem de assumir o papel dos homens no jogo da conquista, talvez descubram que não é fácil ser ao mesmo tempo sedutor e verdadeiro. Talvez elas percebam que é muito difícil, para a maioria dos seres humanos, evitar dizer coisas que o outro deseja ouvir. Precisa ter muito integridade para estar carente diante de uma mulher bonita e não usar as palavras que provavelmente o levarão para dentro do quarto dela – mesmo sabendo, lá no fundo, que você talvez não devesse.
Os homens sabem que as mulheres costumam ser mais sentimentais do que eles e (até inconscientemente), procuram agradá-las. Depois somem, muitas vezes por vergonha. As mulheres, do lado delas, sabem que os caras têm urgência em transar e, às vezes, fingem ser mais safadas e menos românticas do que realmente são. No dia seguinte, sentem vergonha ou cobram do sujeito atenções que não estavam no contrato invisível firmado na noite anterior.
Para evitar esses desencontros, melhor seria tratar as coisas pelos seus verdadeiros nomes.
Que mulher resiste a esse tipo de avalanche? Mas, ao mesmo tempo, que mulher com mais de 20 anos não sabe que esses exageros não passam de fogos de artifício?
Esse é o contexto, eu acho, para localizar a queixa da moça no mundo real.
No dia em que as mulheres tiverem de assumir o papel dos homens no jogo da conquista, talvez descubram que não é fácil ser ao mesmo tempo sedutor e verdadeiro. Talvez elas percebam que é muito difícil, para a maioria dos seres humanos, evitar dizer coisas que o outro deseja ouvir. Precisa ter muito integridade para estar carente diante de uma mulher bonita e não usar as palavras que provavelmente o levarão para dentro do quarto dela – mesmo sabendo, lá no fundo, que você talvez não devesse.
Os homens sabem que as mulheres costumam ser mais sentimentais do que eles e (até inconscientemente), procuram agradá-las. Depois somem, muitas vezes por vergonha. As mulheres, do lado delas, sabem que os caras têm urgência em transar e, às vezes, fingem ser mais safadas e menos românticas do que realmente são. No dia seguinte, sentem vergonha ou cobram do sujeito atenções que não estavam no contrato invisível firmado na noite anterior.
Para evitar esses desencontros, melhor seria tratar as coisas pelos seus verdadeiros nomes.
Um homem que está com tesão não deveria esconder o seu desejo por trás
de uma embalagem de romantismo. As mulheres, ouvindo a verdade, poderiam
escolher se querem ou não – e muitas diriam sim, porque sexo
desencanado também é bom. Num mundo assim, menos mulheres se sentiriam
enganadas e um número menor de caras faria papel de mentiroso. E a moça
da festa talvez não estivesse com tanta raiva.
(Ivan Martins escreve às quartas-feiras NA REVISTA EPOCA)
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