terça-feira, 25 de agosto de 2015

Dê um jeito no seu sonho

 
O que abunda não prejudica, afirma com razão o provérbio. Melhor sobrar do que faltar, repete o senso comum. Mas entre nós, brasileiras e brasileiros, quantas vezes experimentamos a abundância ou a sobra?
Somos uma gente criada, na sua maioria, na escassez e nos precisos centímetros. Aprendemos em ambientes nos quais sempre falta algum capítulo da cartilha ideal. Ora não há dinheiro, ora não há pessoal treinado, ora inexiste infraestrutura.
E de nada adianta culpar o Seu Cabral, o rei, os imperadores, os republicanos. Assim como ajuda pouco desancar políticos e eleitores. Nossa fome é mais complexa, nossos problemas mais disléxicos. Para alcançar a fartura, teremos que melhorar o fora e o dentro. O avião e o aeroporto.
Também acredito que na Finlândia, Suécia, Japão, EUA, haja cenários mais propícios para que indivíduos e equipes possam, trabalhando duro, realizar seus projetos. Por aqui, não faltam trabalho duro e nem frustrações profundas. Você já não empreendeu algo que morreu na praia?
De solavancos, derrapagens e atolamentos em estradas de terra, aproveitamos algumas lições. A principal delas é que sonhar não basta. O sonho é como um motor de arranque. O que tira você da inércia para o movimento. Mas ele sozinho não é suficiente.
Sonho transformador é aquele que se torna concreto na vigília. Então, depois do arranque, para seguir viagem até o destino, são necessários combustível, provisões, peças de reposição. Também bem-vindos GPSs, roteiros, informações.
O que nos salva da noite sem luz é que a escassez pode favorecer a criatividade. Pois o "não ter tudo" cutuca a inteligência. Faz muitos anos, tive a honra de entrevistar a cientista Johanna Döbereiner (1924-2000), então pesquisadora da Embrapa - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. A doutora já estava no final de sua interessante vida.
Ela foi autora e coordenadora de pesquisas sofisticadas e inovadoras na agrobiologia. Nossa potentosa produção de soja deve muito a ela. Johanna ensinava: "Não é porque faltou um barbante ou papel alumínio que vamos paralisar um projeto."
É evidente que não estou fazendo a apologia da desgovernança ou da carência. Mas observo que ações vitoriosas são aquelas regadas pelo entusiasmo, pela persistência e por baldes cheios de soluções inventivas.
Por Fernanda Pompeu
Imagem: Régine Ferrandis.

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